Cuidar é um Direito Humano: Entenda a decisão histórica da Corte Interamericana
Corte IDH reconhece o Direito ao Cuidado no Parecer Consultivo OC-31/25

O que é a Corte Interamericana de Direitos Humanos?
A Corte Interamericana de Direitos Humanos (Corte IDH) é um tribunal internacional com sede em San José, Costa Rica. Criada a partir da Convenção Americana de Direitos Humanos, também chamada de Pacto de San José da Costa Rica, a Corte IDH integra o sistema interamericano de proteção dos direitos humanos, ao lado da Comissão Interamericana de Direitos Humanos.
A Corte IDH tem duas funções principais:
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Função contenciosa: julga casos de violações de direitos humanos cometidas por Estados que aceitaram sua jurisdição.
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Função consultiva: emite Pareceres Consultivos, que interpretam normas internacionais de direitos humanos e orientam os países sobre sua aplicação.
O Parecer Consultivo OC-31/25: um marco histórico sobre o Direito ao Cuidado
Em 2025, a Corte IDH publicou o Parecer Consultivo OC-31/25, solicitado pela Argentina, que trouxe uma decisão inédita: o reconhecimento do cuidado como um direito humano autônomo.
O processo contou com ampla participação social:
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Mais de 129 contribuições escritas vindas de Estados, organizações da sociedade civil e universidades.
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Audiência pública em 2024, com 67 delegações presentes.
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O parecer foi adotado em 12 de junho de 2025 e notificado em 7 de agosto de 2025.
O que significa o Direito ao Cuidado?
A Corte IDH definiu, entretanto, que o direito humano ao cuidado possui três dimensões complementares:
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Ser cuidado — o direito de receber cuidados de qualidade, fundamentais para viver com dignidade.
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Cuidar — o direito de exercer a atividade de cuidado (remunerada ou não) com respeito, proteção social e reconhecimento.
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Autocuidado — o direito de cuidar de si mesmo, garantindo bem-estar físico, emocional, mental e cultural.
Fundamentos do Direito ao Cuidado
O parecer se apoia em princípios fundamentais dos direitos humanos:
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Corresponsabilidade social
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Solidariedade
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Igualdade e não discriminação
A Corte IDH destacou ainda que o cuidado é uma necessidade universal e deve ser tratado como parte essencial da vida em sociedade.
Desigualdade de gênero no cuidado
Contudo, um dos pontos centrais do Parecer OC-31/25 é a desigualdade de gênero:
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Mulheres realizam três vezes mais trabalho de cuidado não remunerado do que os homens.
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Esse trabalho invisível impacta direitos como educação, trabalho e seguridade social.
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Apesar de ser essencial, o cuidado não remunerado raramente é reconhecido nos sistemas econômicos.
Dever dos Estados segundo a Corte IDH
A partir do reconhecimento do cuidado como direito humano, os Estados devem:
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Criar sistemas nacionais de cuidado, incluindo creches, serviços de apoio a idosos e pessoas com deficiência.
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Valorizar cuidadores e cuidadoras, assegurando condições dignas de trabalho e proteção social.
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Combater estereótipos de gênero, promovendo igualdade real.
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Garantir o direito ao autocuidado, inclusive em saúde sexual e reprodutiva, com acesso a serviços, informação e consentimento livre e informado.
Por que esse parecer é importante?
O Parecer Consultivo OC-31/25 da Corte IDH é histórico porque:
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É o primeiro tribunal internacional a consagrar o cuidado como direito humano autônomo.
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Serve como referência para legislações, políticas públicas e decisões judiciais nos países da América Latina.
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Reforça a igualdade de gênero, reconhecendo o valor social e econômico do trabalho de cuidado.
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Fortalece a proteção de crianças, adolescentes, idosos e pessoas com deficiência.
Estatísticas relevantes
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Segundo a CEPAL (2022):
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Mulheres dedicam, em média, 22 a 25 horas semanais ao cuidado não remunerado.
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Homens: apenas 8 a 10 horas semanais.
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O trabalho doméstico e de cuidado não remunerado representa entre 15% e 24% do PIB nos países da América Latina, mas não é contabilizado oficialmente.
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No Brasil, dados do IBGE (PNAD Contínua 2022):
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92% das mulheres cuidam de pessoas ou realizam afazeres domésticos semanalmente.
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Entre homens, 80%.
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Mulheres dedicam em média 21,3 horas/semana, contra 11 horas/semana dos homens.
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Estatísticas sobre quem cuida de familiares com deficiência e autismo
Sobrecarga entre mães de crianças com autismo no Brasil
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Um estudo com 51 mães em contexto clínico encontrou que 64,7 % relataram sobrecarga, sendo 52,9 % em grau leve a moderado
Cuidadores familiares e sofrimento mental em nível global
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Um estudo de 2024 mostra prevalência elevada de 45% de sintomas depressivos entre cuidadores de crianças com TEA (Transtorno do Espectro Autista)
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Outro estudo evidenciou que mulheres, especialmente mães, apresentam níveis mais altos de sofrimento psicológico e percepção de sobrecarga do que homens
Tempo dedicado ao cuidado e impacto físico/emocional
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Nos EUA, cuidadores familiares dedicam em média 24,4 horas por semana ao cuidado — e quase 25% passam 41 horas ou mais nisso
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Aqueles que cuidam por 21 horas semanais ou mais enfrentam sobre carga alta, enquanto quem dedica menos horas tem menor nível de estresse
Dados gerais sobre cuidadores familiares (incluindo mães e familiares de pessoas com deficiência)
Prevalência global e papel feminino
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Nos Estados Unidos, cerca de 26,5% dos adultos são cuidadores familiares — e em 2020, mais de 53 milhões de americanos (20% da população) cuidavam de pessoas com deficiência; entre eles, mais de 60% eram mulheres
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Em até 81% dos casos de cuidado a idosos, a responsabilidade recai sobre mulheres
Carga socioeconômica e de saúde para quem cuida
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Mais de 60% dos cuidadores familiares relatam ter reduzido horas de trabalho, tirado licença ou feito mudanças na carreira devido às responsabilidades de cuidado
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Esse grupo apresenta alto risco de estresse físico e mental, incluindo depressão e piora da saúde geral
Conclusão
Todavia, o Direito ao Cuidado, reconhecido pela Corte IDH no Parecer OC-31/25, representa um salto civilizatório: traz visibilidade ao trabalho invisível do cuidado, promove igualdade de gênero, reforça a proteção de pessoas vulneráveis e obriga os Estados a adotar políticas públicas que tornem o cuidado um direito acessível a todos e todas.
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